31 de dezembro, de 2022 | 14:00

Opinião: Crônica de Ano Novo

William Passos *

Dizem que perda de mãe é a pior dor da vida. Não sei. Só conheço perda de pai. Luzia perdeu mãe e, depois, pai de repente. No ano novo da infância de Luzia era preciso recomeçar.

Recomeçar nem sempre é fácil. Luzia era uma menina calada. Difícil de adoção. Até que uma senhora de posses do Rio de Janeiro a pegou para criar, como se diz, e decidiu mandá-la para um internato de freiras.

Não sei até que série estudou, mas lia e rezava em italiano e latim com enorme desenvoltura. De tanto ouvir os Pai Nossos e Ave Marias sussurrados, aprendi também. E a memória da minha avó rezando fez com que, sozinho, descobrisse a pronúncia correta das palavras do breviário que eu abria escondido, na língua de Sêneca e de Cícero.

Sêneca e Cícero, nas palavras que escreveram, falavam da importância da amizade e do quanto os amigos são importantes para o bem viver.

Verdade. Os amigos importantes, aqueles de verdade, estão conosco nos bons e maus momentos. Ficam felizes com as nossas alegrias, tristes com as nossas perdas. Ajudam a aliviar nossos enlutamentos.

Na canção A lista, Oswaldo Montenegro sugeriu: "Faça uma lista de grandes amigos/ Quem você mais via há dez anos atrás/ Quantos você ainda vê todo dia/ Quantos você já não encontra mais".

“Sêneca e Cícero, nas palavras que escreveram,
falavam da importância da amizade e do quanto
os amigos são importantes para o bem viver”


Não poderei abraçar Luzia neste ano novo, mas Luzia vive dentro de mim. Na lembrança do biscoito de maisena em pote de plástico transparente com tampa redonda que ficava ao livre alcance das mãos dos netos. Na memória dos copos de alumínio feitos à mão pelo meu avô, do qual só guardo uma única lembrança vivo. A lembrança de um abraço com muito afeto.

Afetos, aliás, são muito importantes. Que neste ano novo tenhamos muito afeto. Que possamos abraçar mais. Fazer novos amigos e estar mais próximos dos velhos. Escutar com mais atenção o canto dos passarinhos, a alegria da saudade dos cachorros, o pedido de afago dos gatinhos. Jogar mais conversa fora rindo de coisas que damos menor importância.

Que demos, enfim, mais importância para o bem que fazemos e a saudade que deixamos nos corações. Que choremos sim. Choremos mais. Chorar é importante. Água salgada faz bem. Que possamos chorar mais, suar mais e contemplar mais o mar a nossa frente, sentindo o cheiro da maresia. Que possamos ouvir mais o som das cigarras ou outros bichos de preferência. Gosto das cigarras porque elas lembram a casa da minha avó. Tinha cigarras na casa da minha avó. E galinhas de ovos azuis e galinhas de ovos de duas gemas. E uma jabuticabeira e um pé de carambola que eu gostava de subir desobedecendo a minha mãe.

Que possamos saborear mais carambolas ou outras frutas de preferência. Que possamos escutar mais nossas músicas favoritas. E por falar em música, que 2023 seja para nós como “Some Over The Rainbow”. Esta música diz que, em algum lugar além do arco-íris, os sonhos que realmente sonhamos se tornarão realidade e os problemas derreterão como gotas de limão”.

E por falar em sonhos, se no teatro da sua vida 2023 for um ano de grandes espetáculos, que seja uma peça de William Shakespeare, uma comédia para você dar muitas risadas com a leveza de um “Sonho de uma Noite de Verão”. A você e a todos os seus, um 2023 de guardar entre as melhores memórias.

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Comentários

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Gildázio Garcia Vitor

01 de janeiro, 2023 | 08:40

“Excelente! Parabéns! Obrigado!
Nestes últimos quatro anos passados, fomos obrigados a guardar muita coisa desagradável em nossas memórias, então, que tenhamos boas coisas para guardar na memória.”

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