07 de junho, de 2022 | 11:00

Tem gente passando fome...

Nena de Castro *

Disgramera de realidade dorida, enfrentada por grande parte do povo brasileiro, esse é também o título de um poema de Solano Trindade, poeta pernambucano nascido em 1908. Era um homem simples, humilde, que cantou em seus versos a simplicidade, a dignidade e a luta da mulher e do homem negro, destacando seus valores, amores, dores e conquistas.

Em seus versos ele canta “irei em busca da paz/ do alimento e do abrigo/ para quem trabalha/ e assim cumprirei a minha missão de poeta”.

Folclorista, pintor, ator, teatrólogo, cineasta e militante do Movimento Negro e do Partido Comunista foi ativo na luta pela igualdade. Morou e trabalhou em Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e Embu das Artes. Seu pai, Manuel Abílio Trindade era sapateiro e a mãe, Emerenciana Maria de Jesus, do lar. Considerado o poeta do povo e pai da poesia negra brasileira, Solano foi o grande criador da poesia “assumidamente negra”, segundo muitos críticos.

''E assim no dia 13 de maio
de 1958 eu lutava contra a
escravatura atual - a fome''!


Seu canto poético é, sobretudo, a arte de resistência. Participante ativo da cultura negra do Brasil, Solano deixou marcas na história cultural do país. Sua luta aparece sob diferentes formas nos poemas que denunciam a escravidão; na exaltação da cultura enraizada na África e por aqui, às vezes, ignorada; a insistência em declamar o amor com o princípio de liberdade. Considerado nosso 'poeta negro', foi exemplo de força e coragem. Interessante é que frequentou a Igreja Presbiteriana por uns tempos, chegando a ser diácono, mas saiu, desiludido por não ver nenhuma forma de luta em favor dos negros.

Seu poema “Mulher Barriguda”, excepcionalmente atual, foi gravado pelo conjunto “Secos e Molhados e Ney Mato Grosso cantando “qual é o destino que ele vai ter” não me sai da cabeça. Pobres grávidas, pobres filhos... Ney gravou também o poema que dá título a esta crônica e a famigerada censura não gostou, como é que no “milagre brasileiro”, alguém podia morrer de fome?

Outra que fala sobre a fome, com verdadeiro conhecimento de causa é a extraordinária Carolina de Jesus. Negra, favelada e pobre, catadora de papéis, tentando alimentar a si mesma e a seus filhos, registrou em seu livro ''Quarto de Despejo'': "Eu sou negra, a fome é amarela e dói muito". Amarela da cor da bile que se vomita quando o estômago está vazio, amarela como o seu mundo embaçado pela tontura.


''A tontura da fome é pior do que a do
álcool. A tontura do álcool nos impele a
cantar. Mas a da fome nos faz tremer. Percebi
que é horrível ter só ar dentro do estômago''.


Posé, todas as vezes em que coloco comida na mesa, agradeço a Deus por poder alimentar minha família. Mas também oro pelas mães que nada têm para dar a seus filhos, pelas crianças com frio e fome em nosso país. AS POLÍTICAS EQUIVOCADAS, a desonestidade, a má vontade e os erros levaram o preço da comida às alturas. Por isso, além de tentar minorar a situação, devemos escolher bem em quem votaremos, porque caso contrário, continuaremos a ver o triste panorama.

* Escritora e encantadora de histórias

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Comentários

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Tião Aranha

07 de junho, 2022 | 21:20

“Vendo essas séries de cinema vejo que essa luta de cristianismo versus reinado vem lá de trás. Então fico pensando: /qual das fomes é a mais perversa/ - será a material ou a espiritual? (Uma é tolerável, a outra não). Risos.”

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