28 de dezembro, de 2021 | 13:41

De verde, ascendências e o ''bicho''...

Nena de Castro *

Reputo à minha ascendência africana e indígena o amor que sinto pelo verde. Me faz bem andar no meio de árvores, lidar com plantas, afofar a terra...Meu pequeno jardim tem algumas árvores, o que me deixa feliz: pé de limão, de Escumilha que veio da Bahia, além de jasmim do campo, pé de hibiscos, um pé de cajá, plantado no chão, outro plantado no vaso que está carregadésimo, um de manga, a figueira Inês, um de maçã, um de pêssego, esses últimos no vaso. O verde me remete ao espiritual, penso na energia da terra, no frescor das plantas e daí me conecto com o Criador de todas as coisas. Ele nos presenteou com um planeta de águas límpidas que vamos emporcalhando e florestas estupendas que botamos abaixo. O ser humano tem titica na cabeça, só pode, pois destrói tudo visando lucro e o resto que se estoure. Bem pra não ser injusta, tenho também um cadiquim de sangue português (quem não tem?) e é essa parte que me faz ter tanto medo de tudo que pula e se arrasta. Claro que é culpa dos brancos, quem já ouviu falar de índio dando estrimilique por causa de cobra e africano com medo de andar pelas selvas? Ara! Então sou eu, o resultado da mistura de raças, os afros se misturaram com os índios e surgiram os bugres. A bem da verdade mistura de branco com preto deu mulato, branco com índio deu mameluco (caboclo) e dos índios com negros vieram os CAFUSOS. Sendo eu uma CAFUZA CONFUSA, tento decodificar as esdrúxulas convenções dos homens e suas desculpas para menosprezar o seu semelhante, usando a cor da pele como desculpa.

Meus avós vieram ali dos lados de Peçanha e se instalaram em Chonin de Cima quando tudo era mata virgem e minha mãe dizia: “a mãe da mãe da mamãe foi apanhada no laço”, ou seja, minha ascendente de sexta geração era índia. Pega no laço como um animal, tadinha. Não só ela, mas milhares de outras jovens eram capturadas, separadas de sua gente e aculturadas. Sisteminha desgraçado que privilegiava o branco e ferrava com os outros. Vez que não quero continuar nesse assunto, volto a falar de plantas: como toda Ipatinga, o bairro Imbaúbas tem muito verde: plantas nos quintais e no entorno pelo lado do antigo Areal, passa pelo que chamamos de barranco e vai até o Unileste; muita sombra e alegria, pássaros, saguis que volta e meia vêm até nossas casas, jacus em profusão... Apesar dos prédios que anunciam o “pogressio” trazendo muita gente para pouca infraestrutura, ainda somos felizes. Então na quinta-feira véspera de natal, subi o pequeno morro da caixa d’água ali pelas 9h, para fazer oração. Muitas pessoas oram lá, é sossegado, tem uns pinheiros que enchem o chão de galhinhos parecendo agulhas negras, o que me faz pensar num bosque europeu.

“Tento decodificar as esdrúxulas
convenções dos homens e suas desculpas
para menosprezar o seu semelhante,
usando a cor da pele como desculpa”


Aí, lá estava eu, sem máscara, respirando fundo, agradecendo a Deus pela minha família, pelos livramentos concedidos e então eu vi algo se mexendo a uns 10 metros de mim. Abri a boca espantada: um treco de um metro, verde como jacaré, andando como jacaré, ia para o lado oposto ao meu! Quis correr, mas pensei, vou tirar uma foto, mesmo dessa distância, bati duas, não saiu nenhuma, tentei filmar e capturei imagens do chão, árvores de cabeça pra baixo. Dei um passo pra frente morta de medo do trem correr atrás de mim, ele levantou a cabeça e virou um pouco, farejando, o que foi suficiente para eu sair correndo e descer do local em questão de segundos...

Contei pra minha família, tentamos ver na filmagem galopante, não deu e afinal meu filho falou: Dona Nena, a senhora sempre foi meio doidinha, crítica do sistema, revoltada com injustiças, caótica, faladeira, já conversou com passarinho e ele respondia, (Magali Siqueira e Nancy Nogueira são testemunhas), mas mentirosa, nunca foi! Então deve ter visto, não um jacaré, mas um teiú gigante. Não vá mais lá, vai que o bicho cisma com a senhora e eu não tenho a mínima vontade de ficar órfão e perder minha cozinheira predileta.

E nada mais digo, a não ser que 2022 está aí e a “bicharada” precisa deixar o brasileiro em paz. Que haja respeito ao povo desse país. Feliz Ano Novo. Z Au Revoir.

* Advogada, escritora e Encantadora de Histórias

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Comentários

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Javé - do Outro Lado do Mundo

28 de dezembro, 2021 | 18:49

“O homem da selva, o homem primitivo, o homem burguês, está adstrito às mesmas bases naturais de sobrevivência. O difícil é a convivência com essa bicharada que se diz racional. Risos.”

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