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05 de novembro, de 2022 | 14:00

Histórico: Assembleia Nacional de Angola será presidida pela primeira vez por uma mulher

Maria Inês Vasconcelos *

A violência política em face da mulher é uma caricatura da opressão de gênero. A bem da verdade, a sub-representação das mulheres nos espaços de poder político não é privativa do Brasil, mas um fator mundial. Apesar disso, seguimos pelo mundo: avançando, reagentes, mesmo em campos minados pelo machismo.

A vitória, em Angola, da ministra de Estado, Carolina Cerqueira, para a Presidência da Assembleia Nacional, após uma disputa contra três homens pelo cargo máximo do Poder Legislativo comprova o absolutismo masculino no campo político no país. A eleição de Carolina é, sem dúvida, um fato amplificador do avanço da ocupação pela mulher de espaços tradicionalmente político-masculinos.

Carolina Cerqueira, que é representante do partido de centro-esquerda MPLA no parlamento de Angola, está longe de ser mero personagem de uma história de sucesso. Ela representa muito mais: a ruptura histórica da política do país. Sua posse retrata uma mudança de comportamento já iniciado pelo próprio povo angolano, que reconhece e apoia as seguidas lutas femininas pela igualdade de oportunidades na política, sem evasivas.

Carolina é a pura efervescência democrática, que facilita encontros políticos e acolhe diferenças numa instância inédita.

Na agenda do continente africano existem alguns exemplos notáveis que apontam para a adesão da participação feminina na política. A força do movimento feminino, para libertar a mulher, já mostrou que a África ultrapassou os editoriais machistas e que a mulher vem ocupando um papel de resposta em espaços tradicionalmente ocupados por homens. Foi assim com a presidente da Libéria, Ellen Johnson Sirleaf, entre 2006 e 2018, cujo mandato foi marcado pela conquista do Prêmio Nobel da Paz. Joyce Banda também governou o Malawi (2012-2014), assim como Sahle-Work Zewde faz na Etiópia desde 2018. Há uma mudança no rumo do vento.

“Carolina é a pura efervescência democrática,
que facilita encontros políticos e acolhe
diferenças numa instância inédita”


Esses acessos da mulher à política na África rompem com a confiança masculina narcisista de que a mulher não é capaz de representar outras mulheres e o próprio homem. É uma demonstração de perseverança na arena política, relevantíssima.

Angola experimenta uma época bastante fértil na expansão da consciência sobre o papel da mulher na sociedade, de sua força de trabalho e, claro, na política. Em Angola, o lugar da mulher é um lugar de construção, sobretudo, na política. A vitória de Carolina Cerqueira sela esse esforço para que a mulher não se omita ao seu próprio caráter. Além da renovação política e da diminuição do patriarcado, o feito é, sobretudo, um avanço social democrático. Hoje, na prateleira democrática angolana, a mulher tem um lugar mais consolidado do que em qualquer tempo, anistiando tempos de menor expressão das vozes femininas.

Angola segue mostrando que não é um país de reticências. A democracia responde com contundentes pontos de afirmação. A voz da mulher é ouvida. Mulheres podem votar e serem votadas. Muito embora haja forte predominância masculina na Assembleia Nacional e sendo a distribuição populacional entre homens uma divisão, meio a meio, não há como diminuir Carolina, que reforça a participação feminina nos espaços de poder onde a tradição insistia em excluir a mulher.

O edifício da recordação sofreu um retrofit, Carolina é, sem dúvida, a nova fachada dessa construção de um eixo estrutural no Estado Democrático de Direito. Viva Carolina!

* Advogada, pesquisadora, professora universitária e escritora.
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