22 de julho, de 2023 | 12:00

Opinião: É preciso falar sobre as mazelas da educação integral

César Silva *

A meta 6 do Plano Nacional de Educação (PNE) visa oferecer educação em tempo integral em, no mínimo, 50% das escolas públicas, de modo que atenda a, pelo menos, 25% dos alunos da educação básica. Para tal, os estudantes devem ter, no mínimo, 7 horas de atividades escolares. Mas como toda meta, existe uma grande diferença entre a expectativa e a realidade. E, neste caso, o abismo é enorme.

O Censo da Educação de 2020, elaborado pelo INEP – Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, em parceria com as Secretarias Estaduais e Municipais de Educação, demonstra que apenas, 6,9% (12.278) das 178,3 mil escolas públicas brasileiras possuem entre 20% e 50% dos seus estudantes matriculados em tempo integral. Além disso, 50,7% (90.487) das escolas não possuem nenhum estudante com jornada integral.

“Com mais de 47,4 milhões de matriculados na educação básica,
temos apenas 5,4 milhões na educação em tempo integral”


Com mais de 47,4 milhões de crianças e jovens matriculados na educação básica em todas as suas etapas, temos apenas 5,4 milhões de matriculados na educação em tempo integral, quando o esperado seria de, ao menos, 12 milhões de estudantes. Em poucas palavras, não atingimos nem a metade da meta estabelecida.

Mas, o cenário é ainda pior quando olhamos para outro quesito: a qualidade do ensino. Os recursos educacionais e as metodologias não são inovadoras e estimulantes para os alunos, o que pode tornar o tempo integral mais prejudicial que positivo, levando ao aumentando o desinteresse e a evasão. Além disso, a formação de professores é precária, uma vez que a carreira de docência não é valorizada em remuneração e benefícios e o investimento em recursos educacionais é pouco significativo e dissociado de novas estratégias de ensino. Assim, assegurar mais tempo dos alunos nas escolas acaba soando como uma “escola punitiva”, lembrando os antigos internatos usados para assegurar o controle dos estudantes em um “espaço confinado” que se denominava “escola”.

A pauta da melhoria da oferta de educação, da qualidade do aprendizado está associada a três variáveis importantes. A primeira é a seleção dos temas, que envolve a curadoria dos conteúdos a serem desenvolvidos à luz dos interesses dos estudantes pela sua faixa etária, pelo seu espaço geográfico e pela sua realidade social que se associa a história do aluno. A segunda está relacionada à metodologia e os recursos tecnológicos vinculados à proposta de tornar o desenvolvimento aprendizado mais atrativo, mais empolgante, mais aplicável e com sentido, nos níveis do saber, do fazer e do ser. Por último, temos a qualidade do tempo destinado ao estudo. Esta é a variável mais importante e derivada das duas outras destacadas. Não basta que seja destinado um tempo longo ao estudo, ou ao desenvolvimento de competências, habilidades e atitudes, é fundamental que seja adequado em quantidade, momento e intensidade.


“O Brasil está perdendo a chance de formar jovens no
momento histórico em que temos mais jovens em
idade produtiva do que adultos”


É preciso associar e integralizar cargas horárias, saberes existentes, novos saberes e trazer a revisão contínua de todas as etapas do ciclo de aprendizagem. Aumentar o tempo sem respectiva atenção a à forma, aos recursos e, principalmente, às necessidades é desvalorizar um insumo importante como tempo. Desde a sua concepção, a proposta de oferta de educação integral é coletiva e ampla e assim deve ser assumida por todos os agentes envolvidos no processo formativo do estudante em qualquer da sua etapa de vida.

Nesse contexto, a escola se converte em um espaço essencial para assegurar que todos tenham garantidas uma formação integral em todas as suas dimensões. A proposta pedagógica precisa ser articuladora levando em conta as diversas experiências educativas que os alunos podem viver dentro da escola e fora dela, a partir de uma intencionalidade clara que favoreça as aprendizagens importantes para o seu desenvolvimento. É importante que ocorra a partir de uma proposta para o alinhamento do quantitativo com o qualitativo, da capacidade de entender o indivíduo e com ele construir uma trajetória de desenvolvimento da aprendizagem associada a objetivos combinados, estabelecidos e assumidos, de forma ser serem, verdadeiramente, atingidos.

O Brasil está perdendo a chance de formar jovens no momento histórico em que temos mais jovens em idade produtiva do que adultos. O momento é ou formamos bem estes jovens que podem produzir e gerar renda e estimular a economia com empreendedores ou profissionais qualificados, ou, em menos de 20 anos, teremos idosos incapazes de se sustentar individualmente e que dependerão do estado como provedor. Em outras palavras, o país que foi sempre considerado o país do futuro, terá envelhecido antes de chegar a produzir renda para sustentar a sua geração de melhor idade.

* Diretor-presidente da Fundação de Apoio à Tecnologia (FAT)

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Comentários

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Gildázio Garcia Vitor

23 de julho, 2023 | 13:54

“Foi mesmo, Companheiro Tião Aranha, e não foi facil, o dinheiro e o juízo eram curtos. Mas valeu a pena. Pois tinha perdido 5,5 anos fazendo e não fazendo Engenharias no atual Unileste.”

Tião Aranha

22 de julho, 2023 | 17:51

“O companheiro Gildásio deve ter estudado na Fafic. Já dizia Kant que o problema das autoridades e da população é a falta de União. A proposta do colunista é muito boa. Resta saber se esse tipo de escola fora a escolhida e ora planejada voluntariamente pelo povão. Risos.”

Gildázio Garcia Vitor

22 de julho, 2023 | 15:20

“Excelente artigo! Parabéns! Obrigado!
A qualidade ou a falta dela, na Educação, tem que estar relacionada, em primeiro lugar, à qualidade dos Profissionais da Educação. Infelizmente, os Professores somos mal formados e mal informados, isso muito antes do sistema EaD. Portanto, precisamos melhorar, e muito, os cursos de formação de Professores, que sempre deixaram muito a desejar. A minha reconhecida mediocridade é resultado de uma graduação em História, feita em uma Faculdade de "fim de semana" em Caratinga.”

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