
18 de outubro, de 2023 | 12:00
Opinião: Como estragar uma boa lei
Antonio Nahas Junior (*)
O Senado Federal fez um gol de placa. E um gol contra ao mesmo tempo. Aprovou o projeto de lei que estabelece e regula o Mercado de Carbono no país. A Lei visa à redução das emissões de gases efeito estufa, as quais levam ao aquecimento global. O mundo todo está sofrendo os impactos da mudança climática e é uma tendência mundial haver políticas governamentais que criem incentivos, para quem reduzir as suas emissões, e penalidades, para quem descumpri-las.O projeto prevê a redução ao longo de muitos anos, o que permitirá a adequação gradativa da sociedade às novas regras. Não será algo fácil, rápido ou barato. Nossa civilização é movida a fontes de energia fóssil - carvão e, sobretudo, petróleo -, cuja utilização leva à emissão de carbono. A diminuição da utilização de petróleo ou sua substituição por outras fontes de energia só será possível com a utilização de novas tecnologias, como a energia solar e o carro elétrico.
O Senado Federal fez um gol de placa.
E um gol contra ao mesmo tempo”
Será um processo de décadas que levará à desativação de ramos econômicos importantes e à criação de outros setores da economia, aumentando o consumo de novos minerais, como o lítio, que está transformando o Vale do Jequitinhonha no Eldorado mineiro.
Para esta transição, o projeto de lei prevê a criação do SBCE - Sistema Brasileiro do Comércio de Emissão de Gases de Efeito Estufa -, que vai elaborar o Plano Nacional de Alocação que deverá estabelecer as cotas anuais máximas de emissão de gases de efeito estufa para as pessoas físicas e jurídicas. São as chamadas Cotas Brasileiras de Emissões.
Quem emitir mais de 10.000 toneladas de carbono/ano será regulado pelo SBCE. Para termos uma ideia do que isto significa: um carro médio que consuma um tanque de gasolina por semana emitirá 114 kg de CO² por semana ou 6 toneladas por ano. Nas grandes frotas de caminhões ou ramos industriais intensivos no uso de energias fósseis, esta conta pode chegar a centenas de milhares de toneladas.
Mas o SBCE prevê duas possibilidades: quem emitir menos carbono que a sua cota, terá créditos de carbono para vender. Ao contrário: quem ultrapassar a sua cota vai ter de comprar os créditos, se não tiver implementado medidas mitigatórias para compensar a sua emissão acima da meta.
Assim, cria-se o mercado de carbono. Parece uma coisa simples, mas não é. Uma tonelada de carbono hoje vale 5 dólares ou 25,50 reais. E no mundo todo, esse mercado movimentou mais de 100 bilhões de dólares no ano passado. Para acessar esse mercado, será criado também o Certificado de Remoção ou Redução Verificada de Emissões (CRRVE), que equivale a um título financeiro com credibilidade internacional que pode ser negociado nos mercados de crédito de carbono de todo o mundo.
Mais uma coisa: todos terão metas e prazos para redução e até mesmo para poder compensar as suas emissões. Quem não seguir as metas será multado, podendo as multas chegarem a 5% do faturamento da atividade. E o projeto prevê até mesmo o embargo da atividade que não cumpri-la.
O agro continuará livre, leve e solto,
sem regra alguma, podendo desmatar,
usar agrotóxicos e transportar seus
produtos da forma que quiser”
Tudo muito bacana. Mas, estava bom demais para ser verdade: o Senado retirou a aplicação da Lei sobre o maior emissor de carbono no país, o agronegócio. É até difícil de entender: as empresas de transporte de carga; a siderurgia; a mineração; a construção civil; o setor público; os bancos; toda a economia vai ter que se transformar para se adaptar a essa tendência. Será necessário muito dinheiro para substituir e criar novas tecnologias capazes de enfrentar o desafio do milênio.
Mas o agro continuará livre, leve e solto, sem regra alguma, podendo desmatar, usar agrotóxicos e transportar seus produtos da forma que quiser.
É uma vergonha para o Senado e para o país. É bom sempre lembrar: o Senado representa a Federação. São três representantes por estado, independente da população ou importância econômica de cada um deles. É exigida idade mínima para se candidatar: 35 anos. No sistema bicameral brasileiro, cumpre o papel de ser a Câmara Alta, inspirada na Câmara dos Lordes da Inglaterra. O mandato dos senadores é de oito anos e eles têm tempo, dinheiro e estrutura para pensar, pesquisar e elaborar leis que sejam importantes para todos. E cometem absurdos como este.
Atitudes como essa põem em xeque sua função e importância na democracia brasileira, colocando na pauta a importância e a necessidade de uma reforma política que fortaleça a nossa democracia.
(*) Economista. Participou em diversas administrações municipais em Ipatinga e Belo Horizonte. Atualmente, é empresário e gerente da NMC Projetos e Consultoria.
Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
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Tião Aranha
20 de outubro, 2023 | 14:51Bom texto, nosso parlamento é de maioria da Direita. Os países da União Europeia têm controle dos ecossistemas de suas florestas, nós não. Eles acenderam a fogueira do debate do desenvolvimento com sustentabilidade afim preservar a vida das futuras gerações. Se tem muito calor, tb tem muita luz. Um metal pra passar do estado líquido e ser transformado em ferramentas de uso tem que passar pelas mãos do bom ferreiro, sobretudo, conscientes do seu papel. É o mesmo que acontece com a Educação: transformar a escola da saliva e da explicação em inteligente e flexível canteiro de obras, eis a tarefa urgente não só dos educadores, mas tb dos políticos. Nesse parâmetro, essa cúpula partidária que atualmente está no poder tb sonha o mesmo sonho de Celestin Freinet, só que ele era francês. (Sonhar preciso). Entre pensar em fazer - e fazer - existe uma distância muito grande. Risos.”
Tereza Assunção Barros
18 de outubro, 2023 | 21:48Bem, isso está claro para quem acompanha os noticiários. Sr Antônio Nahas é um desses. Mas não vale a pena repetir o que todos já sabem, procure dar uma informação em relação ao assunto descrito o que seria importante o Senado fazer para não deixar o agronegócio isento de responsabilidades, uma vez por exemplo que o boi é o vilão da história . A Inglaterra está muito acomodada, pois não tem criação de gado em grande escala, mas compra a carne bovina, em grande escala do Brasil por exemplo. E então? Como nosso país poderá emitir menos gás carbono uma vez que a criação de gado é a renda de muitos e por isso é o pior dos vilões do efeito estufa?
# fica a dica”