01 de novembro, de 2023 | 13:00
O prejuízo da Usiminas e o lucro da Vale
Antonio Nahas Junior *O mercado reagiu muito bem ao prejuízo apresentado pela Usiminas no terceiro trimestre, apesar das vendas do grupo terem caído 2,5% e os custos terem subido. O término da reforma do alto-forno 3 e seu retorno à operação, animaram os investidores, que esperavam resultados bem piores. Como consequência, as ações da empresa valorizaram, o que é ótimo. Já com a Vale aconteceu o contrário: a empresa lucrou 13,8 bilhões no mesmo período mas os analistas do mercado acharam pouco, pois o resultado foi 41% abaixo do que no mesmo período do ano anterior.
Estas disparidades ilustram o que acontece no Brasil: a progressiva transformação da nossa economia em exportadora de matérias primas, enquanto o setor industrial afunda. Até mesmo a siderurgia - e a própria Usiminas - não escapam desta lógica.
O presidente Marcelo Chara declarou à imprensa que as importações de aço da China têm prejudicado as vendas das siderúrgicas que produzem para o mercado interno, como a Usiminas. Segundo ele, as importações estão equivalendo a 23% do consumo de aço do país, enquanto a média histórica é 12%. "É preocupante porque percebemos que esses produtos claramente têm valores de venda que não compensam o custo de produção", afirmou.
Vamos ver o que acontece: O Brasil exporta minério de ferro para a China, que é o maior produtor mundial de aço, com mais de 1 bilhão de toneladas anuais. A China transforma o minério de ferro em aço, exporta para o Brasil e ameaça a sobrevivência da nossa indústria siderúrgica. Deu para entender? Damos tiro no pé. Exportamos matéria prima para outros países a transformarem em produtos acabados. Nosso país então importa estes produtos e sufoca a nossa indústria. Com isso, a geração de valor na nossa economia diminui; perdemos empregos mais qualificados e agravamos nossa dependência tecnológica de outros países. Certamente, alguma coisa está errada neste ciclo vicioso.
Por que não podemos exportar matérias primas e, também, produzir e exportar bens industrializados e de maior valor agregado, como faz a Usiminas?
Este ciclo vicioso vem se repetindo a décadas no Brasil, fazendo com que nosso país retroceda à década de 50, quando nosso desafio era parecido com a realidade que vivemos nos dias de hoje: transformar a base econômica do país, que à época dependia das exportações de café para consolidar nossa base industrial. Foi desse esforço que nasceram as estatais Vale, CSN, Usiminas, Petrobras -, que transformaram nossa economia e alavancaram o crescimento do país por muitas décadas. Era a chamada "política de substituição de importações", que levou à emergência e fortalecimento do setor siderúrgico brasileiro.
É muito importante o estabelecimento de canais formais de diálogo com o governo para a reestruturação da base industrial brasileira”
Agora, novamente, surge o mesmo desafio. E todos sabem o caminho: fortalecimento e modernização da nossa infraestrutura , incluindo aí não apenas os bens físicos, mas também infraestrutura educacional e tecnológica e política cambial que proteja nossa indústria, propiciando seu crescimento.
O professor Maurício Borges, ex-diretor do BNDES é enfático neste ponto e defende política tributária mais rigorosa sobre a importação de produtos industriais; "Quanto menos abrangentes forem os impostos de importação, mais podem produzir distorções, sendo uma delas a maquiagem (viabilizada pelo subfaturamento), um mal que vem assolando a indústria brasileira. Por essa razão, o melhor tipo de aplicação de um imposto de proteção seria aquele abrangente, abarcando horizontalmente muitos setores e, verticalmente, a totalidade, ou quase a totalidade das cadeias produtivas." Ou seja: quem importa aço, por exemplo, para diminuir seus custos de produção iria pagar impostos até ao produto final.
Assim, não apenas os importadores mas as indústrias aqui instaladas também seriam oneradas.
A questão é complexa mas o debate está colocado e é muito atual. É muito importante o estabelecimento de canais formais de diálogo com o Governo Lula, contando com a participação das indústrias e, também das comunidades envolvidas, para que seja traçado um caminho para a reestruturação da base industrial brasileira.
* Economista. Participou em diversas administrações municipais em Ipatinga e Belo Horizonte. Atualmente é empresário e gerente da NMC Projetos e Consultoria
Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
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