06 de novembro, de 2024 | 09:00
O período chuvoso chegou. Alívio?
Antonio Nahas Junior *
A chuva do fim de ano chegou. As queimadas cessaram. O vale das cinzas” voltou a ser aquele lugar agradável, gostoso de se viver. Estamos novamente em paz com a natureza. Mas, será que esta paz vai durar ou as chuvas trarão novas tragédias ambientais? Nunca se sabe. O certo, porém, é que estas podem acontecer. O regime de chuvas se alterou, trazendo períodos de seca e picos de concentração de precipitações atmosféricas. E, vendo o perfil das nossas cidades, fica claro que ainda não nos adaptamos a esta realidade.Onde moro, há muitas residências, algumas de ótimo padrão localizadas às margens do ribeirão, nas áreas que seriam destinadas às matas ciliares. Nos bairros próximos, são inúmeras as casas penduradas nas beiras dos morros, em locais de muito aclive, certamente construídas sem licenciamento ambiental ou projeto aprovado pela Prefeitura. O que antes poderia parecer seguro, hoje, não é mais.
As tragédias podem vir. O cenário já está montado. Há algo a ser feito? Claro que sim! O Governo federal já liberou recursos para ações destinadas à prática da chamada Justiça Climática. Isto porque as populações que menos contribuíram para o aumento das emissões dos Gases efeito estufa, - são as que menos consomem -, serão aquelas que mais sofrerão com as tragédias climáticas. É o que lemos no item 1 do Plano de Ação Anual do Fundo Nacional Sobre Mudança do Clima: "Finalidade 1 Desenvolvimento Urbano Resiliente e Sustentável, incluindo: 1.2 Sistemas de parques e áreas verdes urbanas; preservação de nascentes e revitalização de rios urbanos; investimentos em resiliência, capacidade adaptativa e redução de riscos de desastres; requalificação urbana para populações em áreas de risco, com foco em favelas e periferias, e reassentamentos; sistemas municipais e estaduais de gestão de riscos de desastres".
É necessário primeiramente conhecer as áreas de risco; cadastrá-las; avisar a população do perigo; criar equipes de prevenção dos desastres; remover as famílias mais expostas ao perigo e, no momento certo, tomar as medidas adrede planejadas.
O que não se pode fazer é flertar com o perigo e deixar como que está para ver como vai ficar”
O que não se pode fazer é flertar com o perigo e deixar como que está para ver como vai ficar. Para a prevenção, diversas cidades do Brasil fizeram seus Planos Locais de Ação Climática, seguindo metodologia estabelecida pelo órgão Green Climate Cities (GCC), sediado em Londres. Ele visa inventariar as emissões de carbono nas cidades; planejar ações para sua redução e também planejar e implementar medidas mitigatórias e preventivas, para que as tragédias urbanas anunciadas sejam evitadas ou amenizadas. A Prefeitura de Belo Horizonte, que muito avançou nesta direção, fez seu Plano de forma bem prática, voltado para ações sob sua governabilidade, definindo orçamentos e instrumentos práticos para a nova realidade com a qual convivemos. Seu Plano contém itens destinados a elaborar e Implementar a Política Municipal de Segurança Hídrica; desenvolver e implantar obras de infraestrutura segundo critérios de Justiça Climática, que entram diretamente na discussão que estamos fazendo.
Na verdade, o ideal é que estes Planos se tornassem obrigatórios para todas as Prefeituras, orientando as leis e as políticas públicas.
Mundo afora - Infelizmente, o que estamos vendo mundo afora é que as medidas que foram planejadas nos Acordos Internacionais que firmados pela ONU para redução das emissões dos Gases Efeito Estufa, responsáveis pelo aquecimento global, não estão funcionando. O Relatório das Lacunas das Emissões, elaborado pelo PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) mostra isto. Segundo reportagem do jornal Valor, os países do G20 aumentaram suas emissões em 1,8% em 2023 e são responsáveis por 77% do número global. "O país que mais aumentou as emissões no ano passado foi a Índia, 6,1%, revelando a conta ambiental da expansão da sua economia, e ficando à frente em taxa de crescimento da China, que emitiu 5,2% mais. Em termos per capita, porém, a Rússia está à frente de todos, com 19 toneladas de CO2 equivalente por pessoa, seguida pelos EUA, com 18."
Até o Brasil entrou nesta lista, ficando em sexto lugar neste ranking global amaldiçoado. Em resumo: nada feito. A coisa continua feia. Por isto devemos ficar conscientes que as tragédias climáticas vão continuar acontecendo por décadas. Daí a necessidade dos municípios se prepararem para esta nova realidade: cuidar das suas áreas reflorestadas; das suas nascentes; dos rios. Aumentar suas áreas verdes; procurar descarbonizar o transporte coletivo e incentivar todos a usar veículos não poluentes.
Sobretudo, prevenir tragédias e desastres ambientais. Essa nova realidade nos faz recordar e deixar bem claro que somos uma das inúmeras espécies que habitam o planeta terra. Que somos dependentes da natureza que nos acolhe, apesar de que, em muitas ocasiões, cercados de edifícios, carros, nos esqueçamos disso. Por isto recorro novamente às palavras de Ailton Krenak, que nos força a abrir os olhos e enxergar quem somos. No seu livro Ideias para adiar o fim do mundo, ele nos alerta que é possível ficarmos um pouco mais no nosso planeta - a espécie humana - , desde que consigamos reprogramar o software mental que governa nossas ações. E podemos concluir que a superioridade da espécie humana é uma ilusão: somos apenas mais uma das muitas espécies, de uma rede interdependente, que garante o ciclo de vida do planeta.
* Empresário, economista, morador do bairro Pedra Branca em Ipatinga
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Gildázio Garcia Vitor
06 de novembro, 2024 | 10:15Excelente artigo! Parabéns! Já enviei para os meus alunos do Ensino Médio, com os quais trabalhamos recentemente Climatologia e Espaço Urbano.
A "contribuição" do Brasil, que conquistou o HEXA, pode estar relacionada à retomada da economia pós-pandemia, nas também às queimadas dos diversos biomas brasileiros e à agropecuária, especialmente a pecuária, com mais de 250 milhões de cabeças de gado liberando metano (CH4) pelo "butano" e pela eructações.”