12 de novembro, de 2024 | 11:30
Sem açúcar e sem afeto
Nena de Castro *
(Há muito tempo eu vivi calado/Mas agora resolvi falar - Roberto Carlos)Hoje, com o perdão de meus cinco leitores, vou contar essa história: Era uma vez, uma família: mãe, um filho e uma filha. Moravam em um casebre caindo aos pedaços, numa floresta. Um lugar triste e solitário. A mãe, sozinha (talvez mãe solo, ou abandonada pelo marido) tenta levar a vida, maltratando borboletas e resmungando. O rapaz é solitário e mau. A menina, que não vai à escola, abandonou sua guitarra e se isola da família ouvindo músicas num velho radinho à pilha. Não conversam entre si. Tudo é dor, solidão, pobreza e tristeza. Um dia, porém, aparece um cara antenado com a natureza, gente boa, um sábio que decide ajudar e vai em busca de uma maneira de trazer mudanças na vida terrível que aquelas pessoas levavam. E consegue. Elas mudam e acabam entendendo que o AMOR É A MEDIDA DE TODAS AS COISAS.
Esse é o enredo de meu livro. Mas, espere, é um livro para crianças. Então, coloquei os personagens como bruxos malvados, cada um sofrendo em seu canto. Assim nasceu o livro LEILOCA BRUXOCA, NADIELA BRUXELA e CIRIDÃO O BRUXÃO”.
Para ter algum mistério, criei uma maldição de uma outra bruxa malvada. E um enigma cuja solução está no nome de uma fruta. E afinal descobre-se que o malvado Ciridão era uma moça, que escondia a sua beleza debaixo de uma roupa escura, como a depressão e tristeza que sentia. Liberta, curada, Cidinha assume sua feminilidade, se enfeita, vai trabalhar, vai aproveitar a vida.
As crianças descobrem um ANAGRAMA: ROMÃ, SEM TIL, LIDO AO CONTRÁRIO É AMOR! Eitaaaaa! E foram felizes para sempre. SÓ QUE NÃO! O livro foi adaptado para o teatro. E para incluir uma pitada de humor, o mesmo ator que faz o Ciridão faz a Cidinha. A peça já foi apresentada várias vezes, no teatro Zélia Olguin, no Teatro do Centro Cultural Usiminas, também em Timóteo, no teatro do Sesi de Mariana e as crianças rolaram de rir. Mas... Na última apresentação da peça, durante o Salão do Livro, uma senhora não gostou. Reclamou em altos brados da peça e me acusou de estar ensinando homossexualismo trans” para as crianças.
Ainda me denunciou para a direção da Usiminas e do Usicultura, ao DOPS, ao PAPA, ao PUTIN, ao TRUMP e sei lá para quem mais.
Eu estava fora, trabalhando na Tenda Literária em Guanhães. Uma amiga professora que levou os filhos, que aliás amaram o espetáculo, assistiu a tudo e me contou. Gosto é gosto e não se discute, né? Não sou a primeira autora a ser mal-entendida. Não posso ensinar interpretação de texto para todos. Nem tampouco fazer a cabeça de pessoas que veem o mal em tudo. Todos têm o direito de gostar ou não de qualquer coisa, mas não de julgar e lançar acusações desse tipo, sem procurar a autora, que sou eu.
E o espetáculo é feito por atores e atrizes competentes, Narjara Ribeiro, a Leiloca, é mãe e professora e todos os artistas são gente boa, pessoas que trabalham de dia e vão pros ensaios à noite, maior dureza.
POSÉ! Agradeço à Cibele Teixeira, que tentou arrazoar com a mãe zangada afirmando que 300 pessoas assistiram e só ela reclamou. Embora eu more e milite na Cultura, Educação, Imprensa e Advocacia há mais de 40 anos em Ipatinga, sendo, portanto, uma figura pública, ninguém me procurou para conversar, ninguém me deu o direito de defesa. Ara! Falem comigo. E meu espetáculo vai continuar. Apenas para evitar que crianças sejam proibidas de vê-lo e se divertirem, haverá uma mudança. Não por medo, porque eu assumo o que faço. Amo as crianças e minha trajetória fala por mim. Respeito o direito dos grupos diversos que lutam por autonomia porque não sou Deus para ficar julgando as pessoas. O que a vida requer da gente é coragem”, escreveu Guimarães Rosa. Iiii, lembrei da Diadorim. E nada mais digo, embora sinta vontade. Afeeeee!
* Escritora e contadora de histórias
Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
Encontrou um erro, ou quer sugerir uma notícia? Fale com o editor: [email protected]
Gildázio Garcia Vitor
13 de novembro, 2024 | 08:37Parabéns pelo comentário Sr. Carlos Alberto! Obrigado pela lição!
Realmente fui muito insensível ao não me solidarizar com a minha querida Bugra Velha, ainda mais sendo um dos seus "cinco leitores" assíduos. O problema, foi ela se autocensurar. Fiquei desnorteado e irado com tal atitude, errando, inclusive, "o meu português ruim" (Erasmo Carlos e Roberto Carlos).
Acredito que precisamos entender que as pessoas, inclusive das Esquerdas esclarecidas, estão ficando cada vez mais dogmáticas, portanto, às vezes, é de bom-senso relevar, no sentido de perdoar, as "Ignorãças" (Manuel de Barros) alheias.”
Carlos Alberto
13 de novembro, 2024 | 05:44Gostaria de solidarizar-me com a Nena de Castro. Conheço pouco, mas o pouco que conheço me dá certeza que não merece o cancelamento da balzaquiana tia do zap, que não soube interpretar o que a autora escreveu.”
Gildázio Garcia Vitor
12 de novembro, 2024 | 15:06Caríssima Velha Bugra, só não entendi porque terá que mudar o espetáculo "apenas para evitar que crianças sejam proibidas de vê-lo e se divertirem". Afinal, quem irá proibir e porquê?
Enquanto intelectuais, artistas, escritores Advogados, políticos, Professores etc. forem se curvando para esta excremento-direita, pior vai ficar a situação daqueles que ainda defendem o Estado Democrático (e) de Direito. Para mim, pior que a censura do Estado é a Autocensura.
E a liberdade de expressão?! O problema é o "Deus, Pátria e Família"”