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24 de dezembro, de 2024 | 08:30

O preço do pacote fiscal

Antonio Nahas *

“Seja para a Presidência da República; para Governadores ou Prefeitos, Governar é muito difícil. Trata-se de lidar com pressões de toda ordem”

Ao fim deste ano, assistimos à votação do Pacote fiscal enviado pelo Governo Federal ao Poder Legislativo, que traz lições para todos os políticos ocupantes do Poder Executivo, sobretudo para os Prefeitos que vão tomar posse agora.

Governar sem o Legislativo é impossível. E, às vezes, com ele também é. Todos sabem que o Governo Lula não tem maioria no Congresso Nacional. Pior: com a obrigatoriedade na liberação das emendas parlamentares, o Executivo perdeu seu principal instrumento de barganha. Órgãos da imprensa estimam que cada parlamentar tem à sua disposição mais de 50 milhões de reais anuais para distribuir aos seus nichos eleitorais, independente dos programas de governo. Estas emendas, por sinal, estavam retidas por decisão do Ministro do STF, Flávio Dino.

Talvez pela falta de base parlamentar, o Governo Lula e seu extraordinário Ministro Haddad tentaram incrementar sua política econômica de forma independente do Legislativo. E deu resultados muito bons: o PIB cresceu quase 7% no biênio 2023/2024; o desemprego caiu e todos os indicadores sociais evoluíram de forma positiva.

Mas a conta viria. A implementação de qualquer política social ou econômica de impacto necessita de mudanças, pois todas as ações administrativas têm que estar amparadas em Lei. E duas dificuldades surgiram: o crescimento dos gastos públicos e o aumento das importações de bens e serviços. O dólar subiu e as contas públicas começaram a apresentar déficits muito altos, que poderiam gerar pressões inflacionárias.

Por que o Governo não planejou as ações para evitar estes problemas? Tudo indica que, por não ter maioria no Legislativo, o cálculo político foi esperar a hora certa para pressionar o Congresso. A estratégia foi segurar as emendas obrigatórias, com apoio do Judiciário e, quando surgisse a pressão social para controle das contas públicas, passar esta responsabilidade ao Parlamento.

O Governo faria sua parte e indicaria as mudanças necessárias, cabendo ao Congresso a responsabilidade da sua aprovação ou rejeição.

O Pacote fiscal foi enviado e muita coisa votada. A estratégia foi bem-sucedida. Mas é bom notar o que aconteceu. Para conseguir maioria, foram liberados no mês de dezembro 8,3 bilhões de reais de emendas parlamentares, após meses de discussão e crise sobre os critérios e a transparência dos repasses. É um contrassenso pagar tanto para conter gastos. Mas assim é o Brasil.

É bom ressaltar os ajustes feitos pelos parlamentares no Pacote. Foi mantido o pagamento pela União das despesas de saúde; educação e segurança pública do Distrito Federal, região de maior renda per capita do país. É um privilégio absurdo, originário da época da criação do Distrito, quando a região necessitava de apoio do Governo Federal para se manter. Sabe-se lá como este subsidio foi mantido. O Congresso manteve também o privilégio para alguns setores do Judiciário e Executivo, de continuarem a receber acima do teto salarial do setor público, fixado hoje em R$ 44.000. As verbas indenizatórias permanecerão fora do valor fixado. Será um teto de mentirinha, apenas para manter as aparências.

Registre-se que as regras para limitação do aumento do salário mínimo e as restrições ao abono salarial foram aprovadas sem restrições. Apenas para o BPC (Benefício de Prestação Continuada) o Legislador preocupou-se em amenizar as novas regras. Houve ajuste apenas para quem ganha muito pouco.

Os militares também terão mais oito anos para implementar a idade mínima para aposentadoria, que passará a ser de 55 anos. Hoje, ela não existe: basta haver trinta e cinco anos de prestação de serviços. Este prazo foi dado para garantir a escala das progressões já prevista na Corporação. E, também, as aposentadorias dos militares continuarão a ser pagas aos seus filhos, após seu falecimento.

Este quadro mostra que a batalha que se travou no Congresso para votação do Pacote fiscal não tem nada de ideológica. Nada a ver com as disputas entre lulistas e bolsonaristas; esquerda ou direita; empresários e patrões. Nada disso. Certos setores vinculados de alguma forma ao aparato estatal têm poder de pressão e fazem valer seus interesses.

E o país que se exploda. É o que diz o jornalista Bruno Carazza, no seu livro "O país dos Privilégios", com o subtítulo "Os velhos e os Novos Donos do Poder", onde Carazza nomina os principais privilegiados do país, alojados naquilo que chama de estamentos burocráticos, baseando em conceitos sociológicos.

Fica uma observação: Seja para a Presidência da República; para Governadores ou Prefeitos, Governar é muito difícil. Trata-se de lidar com pressões de toda ordem, algumas delas inesperadas, que obrigam a mudanças de rumo a toda hora. Sem uma boa equipe; sem planejamento e base no Legislativo, nada vai para frente.

* Empresário, economista, ex-secretário de Fazenda e Planejamento da Prefeitura de Ipatinga. Ex-secretário adjunto de Administração do Estado de Minas Gerais. Foi também Consultor Técnico Especializado da Prefeitura de Belo Horizonte.

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