11 de março, de 2025 | 07:30
Proseando...
Nena de Castro *
Dia! Como sabem, a Bugra que vos escreve, viveu seus primeiros 10 anos no interiorzão de Minas: alguns anos em Mendes Pimentel, que na época era um distrito de Mantena e mais alguns em Tipiti e Boa União. Esses últimos, pra lá de Itabirinha de Mantena, ficavam na chamada Zona Litigiosa ou Contestado e eram motivo de briga feia entre Minas e Espírito Santo, cada qual querendo ficar com o território. Então vivíamos em dupla jurisdição, com polícia mineira e polícia capixaba se estranhando, cada qual em seu quartel e como na briga do rochedo com o mar quem leva tinta é o marisco, sobrava pra nós, o povo que ali vivia.Muita injustiça e perseguição por motivos fúteis: tivemos que nos mudar certa época por que meu pai era amigo de um sargento capixaba e gostava de bater papos longos com ele nas tardes do arraial, no comércio de secos e molhados que possuíamos. O truculento Cabo Machadinho (aquele que aprontou muito também em Ipatinga) passou a perseguir nossa família. Ia acabar em morte, porque João Vieira tinha sido Delegado Civil em Chonim de Cima, possuía armas que ficavam escondidas e não tinha medo de nada! Dona Inês, quando viu que o trem tava feio, rezou dia e noite, fincou o pé e atazanou meu pai até que mudamos de local e passamos a viver em paz.
Mas o que quero ressaltar hoje são os falares dos moradores interioranos, aquela diliça de dialeto mineirês! Amoo! Então, vamos lá, recordando e rindo de certas expressões, algumas das quais ainda uso. As pessoas chegavam na nossa venda e pediam Criosena ( querosene) pra pôr na lamparina; pra dizer que alguém era doido, diziam: Zé Queijim está barrido das idéias! Ou para dizer que alguém crescera muito, diziam: tá bitelona a fia de Zoquinha; tombém um espichelo tá o Manelzim fi dele! Rs. Se alguém ficava contando vantagens, estava cantiando marra!
Já fugir de uma situação de perigo, era correr que nem um tango ou correr que nem uma taca! Pra dizer que não se importava com as críticas dos outros, a pessoa sacudia os ombros e dizia: não dou nem tchum! E colocar um saco de feijão nas costas era pôr na cacunda. Precisava ribuçar(cobrir) os mininu na época de friu, sô! Menino infusado era levado, atentado, incusicado ( do cu riscado) rs. Fico aqui rimueno a mangação de Maria Bundinha pra ribadeu por causa de quê sou magra! Ela veve gavando o corpo dela, ara! Uma hora dessa quando tivé impirucada, taco um mei tijolo nela!” Deu pra entender, espero! Rs. E os xingos? Ao jogar futebol com bola de meia, alguns dos meninos se desentendiam e em posição de luta, começavam:
- Paiaço!
- Paiaço é ocê, pioiento!
- Estrupiço!
- Cê tem nada com isso! _
- Seu nariz tá chei de bicho!
- Ah, é?
- Então cué! - Gambá sirué!
- Tapa na cara cocê num qué!
Meditei muito e penso que cué” pode ser qual é, mas nunca entendi gambá sirué”! Alguém sabe? E vinha o xingo final:
Bem-feito!
Cheira o c... do prefeito!
Vô deixá procê cheirá!
Aí o pau comia! Socos, pontapés, chutes! E se um dos contendentes corria, a molecada corria atrás, gritando: correu de medo, cagou no dedo! No outro dia, estavam todos brincando outra vez! Posé, meus queridos cinco leitores: já balanguei no balango de corda, uso a palavra dijutório até hoje pra pedir ajuda, ficava intertida lendo, já suverti (corri) de confusão e ainda isturdia, quase lancei (vomitei) ao passar defronte a uma venda e iscuitá uns homi conversano e um deles dizendo que não querdita que morreu aquele tantão de gente de Covid e que se morreu, foi pru mode qui tomou vacina! Aí eu quiria esculachá o indiota, mais lembrei do conseio de mãe qui dizia qui a gente num deve perdê tempo com bubice! Sou muito grata por ter vivido no interior e aprendido com nosso povo! E nada mais digo a não ser viva Guimarães Rosa, o escritor que resgatou e mostrou pro mundo os falares dos sertões das Geraes!
* Escritora e contadora de histórias
Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço
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