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19 de junho, de 2025 | 08:00

Os quatro balanços do Lula 3

Gaudêncio Torquato *

O chileno Carlos Matus, ex-ministro de Salvador Allende e especialista em planejamento governamental, oferece algumas pistas para avaliar a gestão de governos. Segundo ele, uma administração pode ser examinada por meio de quatro tipos de balanço: o primeiro é o da gestão política; o segundo, o da gestão macroeconômica; o terceiro, da gestão administrativa, que abrange questões específicas como a desarmonia entre membros da equipe ministerial; e o quarto trata dos programas sociais. Tentemos, então, radiografar o governo Lula 3 à luz desses quatro critérios.

Gestão política - A gestão política envolve a articulação com o Parlamento. Nesse aspecto, o governo Lula poderia ter se saído melhor, ficando aquém das expectativas. A base aliada é instável; parlamentares da situação chegam a votar com a oposição, queixando-se da forma como são tratados por alguns ministros. A governabilidade tem atravessado períodos de tensão, marcados por conflitos entre os Poderes Executivo e Legislativo.

As lacunas nas reformas política e tributária — que já estiveram na pauta dos dois Poderes — empanam o ideário democrático, impedindo avanços compatíveis com as demandas sociais. Avaliado pela gestão política, numa escala de 0 a 10, o governo mereceria nota entre 5 e 6.

Gestão macroeconômica - Este balanço inclui os efeitos políticos e sociais da condução da economia: crescimento, emprego, comércio exterior, inflação e bem-estar material. Neste campo, o maior feito do governo tem sido o controle da inflação, graças aos esforços do ministro Fernando Haddad para equilibrar gastos e receitas. O governo se divide entre o grupo petista — que prioriza o acesso ao crédito para os mais pobres, de olho nas eleições de 2026 — e o grupo que defende rigor fiscal.

No campo do emprego e do bem-estar material, o panorama é positivo. A taxa de desemprego foi de 6,6% no trimestre encerrado em abril de 2025, o menor índice desde 2012. Tanto a pobreza extrema quanto a pobreza geral atingiram seu menor nível desde 2012: 4,4% da população estava em situação de miséria em 2023, o que representa cerca de 9,5 milhões de pessoas — uma redução de 3,1 milhões em relação ao ano anterior.
"A base aliada é instável; parlamentares da situação chegam a votar com a oposição, queixando-se da forma como são tratados"


Apesar da queda da pobreza, a desigualdade de renda persiste: os 10% mais ricos têm rendimento 13,4 vezes maior que os 40% mais pobres. Avaliado sob a gestão macroeconômica, o governo receberia nota entre 7 e 8.

Gestão administrativa - O terceiro balanço trata da administração interna. Há desentrosamento entre ministros; a desarmonia se revela na comunicação deficiente. O ministro Sidônio Palmeira tem se esforçado para criar um espírito de corpo, mas sem sucesso. O presidente Lula chegou a cobrar, em reunião ministerial, mais diálogo interno e maior presença dos ministros nos Estados para divulgar ações do governo. A orientação não surtiu efeito. Numa escala de 0 a 10, a nota administrativa seria entre 4 e 5.

Programas sociais - O quarto balanço abrange as políticas sociais: benefícios, habitação, saúde, saneamento, segurança pública etc.

O saneamento básico é um desastre: apenas cerca de 10% da infraestrutura urbana tem acesso pleno a água encanada e esgotamento sanitário. A saúde continua a refletir o desaparelhamento da rede hospitalar. A dengue, doença controlável, segue fazendo vítimas e afetando a imagem do setor.

O país também vive um clima generalizado de violência. Estima-se que cerca de 50 mil homicídios ocultos tenham ocorrido no Brasil entre 2013 e 2023. O governo encaminhou ao Congresso uma Proposta de Emenda Constitucional para reformar a segurança pública, propondo a integração das polícias, entre outras medidas. No balanço social, a nota estaria entre 6 e 7.
"O maior feito do governo tem sido o controle da inflação, graças aos esforços do ministro Fernando Haddad"


Analisado sob o crivo rigoroso dos quatro balanços de Carlos Matus, o governo Lula 3 apresenta desempenho modesto. Naturalmente, isso se reflete em sua imagem pública. Lula atravessa um inferno astral, depois de ter vivido tempos gloriosos. Ao final do segundo mandato (2007–2010), ostentava 83% de aprovação, o maior índice da história republicana. Hoje, segundo a última pesquisa Quaest, 57% da população desaprova o governo.

Os tropeços recentes ajudam a explicar essa rejeição: tentativa de controle do PIX, pela Receita Federal, gerando temores sobre vigilância estatal; roubalheira no INSS, com descontos indevidos de contribuições associativas em contas de 4 milhões de aposentados e pensionistas; tentativa de aumento da alíquota do IOF sobre crédito, criticada pela má articulação econômica; taxa das "blusinhas", com cobrança de 20% de imposto de importação e até 20% de ICMS sobre compras internacionais de até US$ 50; alta dos preços dos alimentos, em contraste com a promessa de campanha de que o povo voltaria a comer picanha e tomar cervejinha. A "picanha popular" virou meme: "Lula prometeu picanha e entregou osso". A elevada desaprovação ao governo Lula, portanto, tem motivos concretos.

* Escritor, jornalista, professor titular da USP e consultor político

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