DIÁRIO DO AÇO SERVIÇOS 728X90

09 de agosto, de 2025 | 07:30

O looping das massas: Entre o pertencimento e a perda de si

Mauro Falcão *

Na linguagem da programação, um looping é a repetição contínua de comandos até que algo externo o interrompa. Essa metáfora se encaixa com precisão em muitos comportamentos coletivos atuais, em que escolhas são tomadas não por consciência, mas por contágio. A individualidade se dilui na força dos hábitos alheios.

Vivemos imersos em ondas de repetição estética, simbólica, religiosa e política - padrões de beleza, palavras recicladas, crenças automatizadas, bandeiras ideológicas empunhadas. Não há erro em aderir ao que nos inspira; o perigo surge quando já não sabemos por que seguimos. Em muitos casos, não escolhemos - apenas imitamos. A beleza, a fé e os posicionamentos que deveriam nos revelar acabam servindo mais como senha de pertencimento do que como expressão genuína da alma. As redes sociais, ao simular presença coletiva, ampliam esse looping e reforçam a sensação de pertencer, mesmo sem presença física.

A Psicologia das Massas já indicava: quando imersos no grupo, tendemos a abdicar do pensamento crítico. Seguir o fluxo traz a sensação de abrigo, como se o coletivo nos blindasse da angústia existencial. Esse comportamento tem raízes ancestrais. Estar só, na natureza, sempre foi arriscado. Na modernidade, essa lógica se traduz em movimentos
“E se o que você chama de “você” for só uma repetição de padrões? ... Afinal, o que tem guiado nossas escolhas?”
de massa, comportamentos virais e opiniões prontas - formas de camuflagem social.

A filosofia existencialista nos adverte que a liberdade, embora desejada, também oprime. Decidir por si exige coragem. É mais fácil seguir o que já está posto. Heidegger chamava isso de “vida inautêntica”: uma existência guiada pelo impessoal - o que “se faz”, “se pensa”, “se diz”.

Mas há um custo silencioso nesse conforto: o afastamento de si mesmo. Quanto mais nos confundimos com o grupo, mais difícil se torna ouvir a própria voz. E, nesse processo, o sujeito deixa de viver por convicção e passa apenas a reagir por inércia — não vive, é vivido.

Romper o looping não é se afastar do mundo. É apenas voltar a escutar a própria voz. O looping das massas, portanto, é mais do que uma metáfora digital — é uma dinâmica psíquica, social e filosófica, na qual o sujeito abdica da crítica, do pensamento e da existência autêntica em troca de pertencimento. Refugia-se no grupo para não encarar o vazio de si mesmo. “Tendo olhos, não vedes? E tendo ouvidos, não ouvis?” (Marcos 8:18)

* Escritor brasileiro /E-mail: [email protected]

Obs: Artigos assinados não reproduzem, necessariamente, a opinião do jornal Diário do Aço

Encontrou um erro, ou quer sugerir uma notícia? Fale com o editor: [email protected]
Mak Solutions Mak 02 - 728-90

Comentários

Aviso - Os comentários não representam a opinião do Portal Diário do Aço e são de responsabilidade de seus autores. Não serão aprovados comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes. O Diário do Aço modera todas as mensagens e resguarda o direito de reprovar textos ofensivos que não respeitem os critérios estabelecidos.

Envie seu Comentário