22 de novembro, de 2025 | 08:00

Projeto antifacção e o risco de amputar a lei onde mais dói

Miguel dos Santos *


Os senadores começam, nos próximos dias, a discutir o Projeto de Lei 5.582/2025, encaminhado pelo governo federal em 1º de novembro e aprovado pela Câmara dos Deputados em texto substitutivo. A proposta cria a figura penal da organização criminosa, amplia penas e define novos instrumentos para enfrentar quadrilhas que atuam com violência, extorsão e domínio territorial. No Senado, o relator será o senador Alessandro Vieira (MDB-SE), também responsável pela CPI do Crime Organizado.

A autoria controversa da frase “O Brasil não é para amadores” nunca pareceu tão apropriada. Vejam, caros leitores (as) que assim que o texto chegou à Câmara, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (PL), retirou o então secretário da Segurança, deputado federal Guilherme Derrite (PP-SP), para que reassumisse o mandato e conduzisse a relatoria do projeto. A primeira alteração proposta por ele, porém, chamou atenção: a obrigatoriedade de a Polícia Federal pedir autorização prévia aos governadores para iniciar operações nos Estados. A mudança gerou reação imediata - inclusive de aliados, como o governador do Rio de Janeiro - pela percepção de que a medida poderia limitar a atuação da PF.

Após críticas, o relator apresentou novas versões até chegar ao texto atual, que inclui a categoria de “organização criminosa ultraviolenta”. A mudança, à primeira vista, parece endurecer o enfrentamento ao crime. No entanto, ao restringir o alcance da lei apenas às facções classificadas como “ultraviolentas”, o projeto pode deixar de fora uma dimensão igualmente nociva: o braço financeiro do crime organizado, cuja atuação nem sempre envolve violência direta, mas movimenta somas bilionárias.
“O crime do ‘andar de cima’ também precisa ser enfrentado com a mesma firmeza que se aplica ao da rua”


A própria Polícia Federal, na Operação Carbono Oculto, identificou mais de R$ 30 bilhões do PCC circulando por fundos de investimento na região da avenida Faria Lima, em São Paulo. Nesse ambiente, os operadores usam terno, não armas, mas suas ações alimentam estruturas que financiam fuzis, munições e ataques que colocam em risco a vida de agentes públicos e da população. Pois pasmem, eles ficaram fora do alcance da lei proposta por Derrite.

Havia, até uma emenda de autoria da deputada Tábata Amaral (PSB-SP) para incluir no conceito de “organização criminosa ultraviolenta” quem financia, lava dinheiro, administra recursos ou obtém ganhos a partir dessas facções. O combate ao crime organizado exige foco, transparência e rigor - não manobras que possam restringir o alcance da lei. Não é preciso empunhar uma arma para ser violento. O crime do “andar de cima” também precisa ser enfrentado com a mesma firmeza que se aplica ao da rua. Quem acha que os verdadeiros chefões do crime organizado estão na favela, ou é muito inocente ou é desinformado.

* Economista e administrador de empresas.

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